sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Clarabóias — Iluminação natural em espaços interiores


Esta divisão da casa — que é já o resultado de sucessivas remodelações e demolições parciais de uma casa antiga de paredes de taipa e tem servido ultimamente apenas como local de passagem —, por confinar apenas com o resto do edifício e com propriedades de terceiros, não possui janelas. Isso fez com que se tornasse necessário, para ter alguma fonte de iluminação natural, usar umas telhas de vidro. Essa solução funcionou de forma satisfatória enquanto esteve em telha-vã. Duas telhas do mesmo modelo das que compõem a cobertura deixavam passar para o interior a luz possível.
Como agora se colocou um tecto falso (não sei porque se chama tecto falso, porque o tecto é verdadeiro; o que é falso é o pavimento que estaria, mas não está, por cima dele...), foi necessário deixar duas clarabóias para deixar passar a luz fornecida pelas telhas.
Só que esta modificação ia acarretar um pequeno problema: como as clarabóias se encontram a mais de um metro das telhas, a maior parte da luz ia dissipar-se ao espalhar-se pelo "falso sótão" e não chegaria cá abaixo onde faz falta, já que a área das clarabóias é uma fracção mínima da área iluminada acima.
Então, optou-se pela única solução possível: encaminhar o máximo possível de luz para as clarabóias. Isso é possível colocando barreiras que a impeçam de se espalhar e, ao mesmo tempo, revestir essas barreiras com material reflector, para que as perdas sejam mínimas.




Construiram-se umas "torres" (na verdade, uns caixotes de esferovite), revestidas por dentro com papel de alumínio. Estão colocadas exactamente por baixo das telhas e por cima das clarabóias. O efeito é espectacular. A iluminação é muito superior àquela que existia antes da aplicação do tecto (ainda em acabamento). Para reforçar ainda a quantidade de luz disponível, adquiriram-se mais duas telhas de vidro (€16.00 cada uma), que foram colocadas ao lado das que já existiam.


 Foto sem flash.

Foto com flash.




Nem só a andar se faz caminho


Em rigor, o título da mensagem não é verdadeiro. O caminho faz-se ao andar. Pode é, depois, ser alargado, melhorado, pavimentado, recuperado — ou até abandonado.

O caminho da foto começou decerto quando alguém precisava passar para o seu terreno no outro lado do ribeiro e não queria, ou não podia, atravessar as propriedades dos vizinhos. Como os caminhos em cada uma das margens se encontram desalinhados, desviados entre si uns 15 metros, não teve remédio senão passar pelo próprio ribeiro e, assim, alcançar a vereda que já existia no outro lado, ligando-a de novo à assaquia (*) que vem da aldeia.

Nem todos os caminhos são públicos. Nem todos são completamente privados. Há os caminhos vicinais, meio-termo entre as duas situações. Não são de acesso a todos, mas apenas aos que, vivendo na zona ou estando a ela ligados, tenham necessidade de os utilizar, o que exclui os forasteiros ou curiosos. Este é um caminho vicinal.

Passando o caminho pelo ribeiro — mais exactamente ao lado —, é natural que esteja sujeito às contingências da própria evolução do curso de água. As cheias podem erosionar a plataforma que constitui o caminho, ela mesma feita com a areia e o lodo retirados do leito do ribeiro durante as limpezas, com restos de vegetação e outros detritos que caem do camalhão (**) do terreno contíguo. A falta ou demora das limpezas causam assoreamento, entupindo o ribeiro e deixando a água a correr quase ao nível do caminho. Isso sucede com a propriedade a jusante, quintal avantajado dos donos da herdade local, que não cultivam e raramente limpam os terrenos nesta zona. Desde que herdaram a propriedade, nunca limparam, como lhes competia, a parte do ribeiro que ali corre. Para evitar o total assoreamento da parte onde está o caminho (que fica a montante e já fora desse terreno), sou eu próprio quem, de vez em quando, entro ali, mesmo sem autorização, e desvio a vegetação aquática que cresce livremente, para abrir caminho à água. Mas há-de chegar o dia em que o ribeiro esteja tão entupido dali para baixo que já não tenha desnível nem corrente para arrastar as areias e os lodos e fazer auto-limpeza.


Sendo este um caminho vicinal, seria de supor que pelo menos alguns vizinhos/utilizadores estivessem interessados na sua conservação. Não é assim. O número dos interessados é bastante escasso (apenas três famílias o utilizam com alguma regularidade, exactamente o mesmo das que têm ali terrenos cultivados). Sendo pessoas de certa idade e habituadas a só fazer este tipo de coisas quando "tem mesmo que ser", é natural que não se preocupem com "conservação preventiva", especialmente quando ela aparece feita por algum mais voluntarioso. Chegam a atribuir à Junta de Freguesia o trabalho feito por mim... (!) "Parece que  andaram aí os da Junta a limpar o ribeiro", dizem.

A última operação de limpeza resultou numa subida de uns 10 a 15cm do nível do caminho, bem como a um abaixamento de uns 30cm do leito do ribeiro, numa extensão de uns 15 metros, mais outros 15 metros na "quinta" — mesmo assim insuficiente para atingir o que tinha ainda não há muitos anos. Chega, no entanto para evitar que a passagem esteja permanentemente alagada e convertida num lameiro intransitável.


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Notas:

(*) assaquiaregionalismo —  rua estreita que dá acesso às traseiras e/ou às garagens de edifícios.

(**) camalhão = o m.q. combro, ou cômoro, designando  parede ou talude de suporte de terreno em socalco.

 

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Desfragmentação do disco



Eu sei mais a dormir do que… eu próprio acordado!


Costuma-se dizer, quando uma pessoa é manifestamente muito mais inteligente (ou, melhor, mais esperta — o que não é bem a mesma coisa) do que outra, quando as comparamos, geralmente a propósito de uma situação com que estão ambas relacionadas e na qual a primeira levou lógica e esperada vantagem. Também pode ser usada por uma pessoa em relação a outra, como forma de tentar valorizar o seu próprio argumento de autoridade numa discussão.
Mas desta vez é o chamariz para o tema da actividade cerebral durante o sono.

Muitas vezes, ao acordar, recordamos intensamente os sonhos que acabámos de ter e experimentamos a sensação de termos sido, enquanto personagens desses sonhos, capazes de viver situações inimagináveis enquanto acordados. Interrogamo-nos como é que foi possível construir todas aquelas peripécias em que estivemos envolvidos, com uma minúcia e profundidade dignas de um grande romancista (aliás há quem diga que muita ficção é inspirada pelos sonhos — ou pesadelos — dos seus autores).


Dizem os entendidos que, durante o sono, o nosso cérebro se ocupa a pôr ordem naquilo que por lá está guardado e que, sem tal reorganização, o caos acabaria por nos levar à loucura. E até usam isso como argumento para recomendar o hábito de dormir sempre um determinado número de horas, geralmente entre sete e oito, embora também se noticie que grandes génios ou pessoas em destaque nas mais diversas áreas se gabam de apenas dormirem umas três ou quatro horas diárias. 


As ciências que tratam do nosso comportamento e estado de saúde mental têm sido até aqui baseadas, mais do que em dados laboratoriais mensuráveis, na observação e relacionamento empíricos do comportamento humano. Algo como "eh pá, isto tem jeito de ser assim e olha que é mesmo, pois ainda agora Fulano relatou um caso idêntico e Sicrano já o tinha feito também" (isto da identidade entre casos e situações tem que se lhe diga)… A conclusão de que o cérebro faz "arrumações" durante o repouso faz algum sentido, se nos basearmos na observação de que as situações então vivenciadas estão sempre relacionadas com algo que nos impressionou, que teve importância para nós, mesmo que de forma pouco consciente, enquanto acordados. O cérebro não inventa, apenas recria.


Uma característica do tipo de sonhos a que me estava a referir é que são extremamente voláteis, levando a que quase nunca se consiga tirar partido da clarividência demonstrada durante o sono! — o que é uma chatice e um grande desperdício. O nosso cérebro parece ser bastante cioso das suas próprias coisas, partilhando connosco apenas algumas delas e guardando as melhores para si próprio.