segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Para além das boas intenções...



A argumentação usada em certos textos que por aqui circulam sobre os caudais e armazenamentos nas barragens do Fratel e de Belver revelam desconhecimento de como funcionam aquelas estruturas e é susceptível de contribuir, por essa razão, para o descrédito de uma causa válida como é a defesa do Tejo contra os poluidores.

Tentando, como leigo minimamente informado, explicar a razão desta falha:
Trata-se de aproveitamentos hidroeléctricos de fio-de-água, o que quer dizer que funcionam para produção de energia apenas no nível máximo, entendendo-se por nível máximo o enchimento total com pequenas e momentâneas flutuações. Quando não chega de montante água para utilizar, elas simplesmente são mantidas desligadas como forma de manter o nível máximo. No caso destas barragens, que estão (teoricamente) sempre cheias, não faz qualquer sentido falar em variações do armazenamento como forma de comparar os caudais do rio em diferentes momentos. Faria sentido, sim, falar das quantidades de energia produzidas em diferentes períodos. Isso já seria matéria para comparação, porque está directamente relacionada com os caudais.

A Barragem de Alcántara, que é de armazenamento, já pode exercer a função de regular caudais. Se a sua função fosse unicamente essa, seria possível manter um caudal regular ao longo do tempo, baseado na aportação de água recebida. Mas ela foi concebida para a produção de energia. E sendo de armazenamento, a operadora tem todo o interesse em produzir energia nos períodos em que isso seja comercialmente conveniente. É por essa razão que pode haver certa dificuldade em manter caudais regulares, pois, para isso, a empresa seria muitas vezes obrigada a "largar" água contra a sua própria conveniência. Certamente que essas questões técnicas estão reguladas pelos tratados internacionais, mas talvez não tenham descido ao nível de pormenor que evitaria eventuais arbitrariedades cometidas por quem "guarda" a água.


Para dar um contributo válido, não basta ter as melhores intenções. É bom, também, estar-se informado ou procurar o apoio de quem o esteja. Os leitores minimamente informados vão perdoar as incorrecções (tal como, por exemplo, se têm que perdoar os erros ortográficos em muitos contextos — repito: só para exemplificar). Mas nem todos os leitores são minimamente informados e, entre os que o são, há que contar ainda com os mal-intencionados, neste caso, incluindo os que estão ao lado dos poluidores e que vão explorar essas fraquezas.


sábado, 18 de novembro de 2017

Não lutes contra um porco


Explorar um ignorante total não deve dar resultado. Pelo menos não deve dar um resultado previsível. E o que não é previsível pode ser até inconveniente. Não é caminho a seguir. A menos que se eduque um pouco (mas não em excesso) o ignorante total, de modo a que ele tenha aquele mínimo de quase ignorância susceptível de ser explorado.

(Esta era a parte maquiavélica...)

Advirto desde já que me estou nas tintas para o facto, mais do que comprovado, de que aquilo que é vantajoso geralmente não deve ser assumido. A velhacaria está em fazer sem dizer, ou dizendo até coisas contra a velhacaria que, ao mesmo tempo, se pratica. A sinceridade não ajuda ninguém a enriquecer (a não ser os insinceros que estejam por perto e se aproveitem).
Para dizê-lo com maior rapidez: os macacos têm esperteza suficiente para enganar os outros macacos e não só. No entanto, são incapazes de escrever ensaios filosóficos. Do mesmo modo que há muito filósofo a passar por pateta, sem necessariamente o ser. De maneira que não é muito útil ser filósofo no meio dos macacos... Qualquer macaco põe com a maior facilidade cuspo atrás da orelha de um filósofo. Cuidado, portanto.
Tendo a sua dose de macaquice (dose moderada, senão lá se vai a autoridade do macaco chefe), qualquer macaquito derruba, pela rapidez ou pela popularidade, ou por uma espertice qualquer, um argumento inteligente (não esquecendo que, tantas vezes, um argumento inteligente é aquele que não se fez...).
E nunca esquecer que, em última instância e para te vencer definitivamente, o macaco vai atirar-te merda à cara, em qualquer altura. Não tens hipótese contra o macaco. Contra nenhum dos macacos. Nem contra o macaquito que te atira merda à cara, nem muito menos contra o macaco chefe que não o faz, porque o seu estatuto já não lhe permite sujar as mãos. Estás perdido se caíste no meio dos macacos. Foge daí assim que puderes.


O ignorante total não sabe nada. Para os devidos efeitos, não existe. Não se conta com ele. Pode ser perigoso, porque é imprevisível, mas não tão perigoso como aquele que sabe qualquer coisa mas que não passa daí. O quase ignorante é o candidato perfeito a soldado da desinformação. Disse soldado, não oficial. Pode até ser furriel ou sargento, mas daí não passa. Os oficiais da desinformação estão bem informados. O soldado não. O soldado sabe disparar uma arma com perícia, mas não tem a menor ideia de que material é feita. Nem precisa de ter. Desde que abata quem lhe aparecer pela frente, tudo o mais é supérfluo.

Especialmente a filosofia.

Como é que é aquela frase?
Nunca discutas com um estúpido...
Nunca lutes corpo a corpo com um porco...
Por aí anda a coisa.

O macaco, o estúpido, o soldado, o porco — podem estar a ser explorados. Mas quem na verdade te venceu foi o macacão que os explora. E que, a seguir, até pode vir dar-te uma palmadinha de conforto nas costas, para que, em qualquer altura, o julgues teu amigo.

A política é tramada.
A política e não só.

Perigosos mesmo são os macacões.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Os padrinhos


O caciquismo, o nepotismo, o amiguismo, o compadrio não são bem culpa daqueles que os praticam. É preciso um grande esforço para alguém deixar de dar preferência a quem lhe inspire maior confiança, como pode ser o caso dos mais próximos. Quando uma determinada família política, que pode ser também família em sentido restrito, se instala no poder durante muito tempo, dificilmente de lá sai. Tudo começa a girar à volta daquele núcleo e fora dele pouco existe. Num tal sistema, a palavra democracia começa a fazer cada vez menos sentido. As decisões importantes nunca são tomadas dentro das instituições próprias, mas sim pela "capelinha" e, dentro dela, pelo(s) cacique(s) de turno. Eles são cada vez mais poderosos, é certo, mas será que se deve esperar que renunciem a esse poder?